segunda-feira, 23 de agosto de 2021

O Rio dos Bois já secou, em Quirinópolis.


Foto: Estiagem de 1924-5, SP.

Falar do Rio dos Bois transformado em filete de água e pequenas poças, aqui e acolá, é assunto que quase  ninguém acredita. Contam os moradores mais antigos, que no século passado, várias estiagens  afligiram a região de Quirinópolis e o  Estado de Goiás. 

 A história de que o Rio dos Bois secou  sempre circulou entre pessoas antigas, que vivenciaram os fatos. O senhor Francisco Rosa Ribeiro, pai deste mensageiro, relatava esta história e cansou de afirmar o que ouviu de seus tios, todos de muita respeito e credibilidade, da época em que os homens eram muito sérios e as suas palavras valiam.

Esse situação crítica causou muito sofrimento para  os moradores locais, com a falta de água e as consequências da seca severa, com perdas de suas plantações, falta de pastagens, perda de gado e outras criações, inclusive cisternas secas e falta de água para o consumo dos famílias.

     Segundo relatos, em 1924-5, houve aqui uma estiagem tão prolongada  que fez  secar rios e córregos. Não sobraram exceções, inclusive o rio São Francisco e os córregos Grande, Fundo e Castelo, este em secura  completa,  obrigando os criadores a levar o gado para as poucas aguadas que restaram. Foi o caso do senhor Benedito Rosa de Morais, proprietário de um grande rebanho bovino na região das Sete Lagoas, que vivenciou estes  acontecimentos, ao ter de deslocar seu gado para as proximidades de uma nascente  do córrego Grande, na Serra do Paredão. Era  a única fonte segura  de água para o gado em toda a região e por isso teve que dividi-la com alguns vizinhos. 


             Nas imediações deste bebedouro natural se concentravam as criações  de sua família e de alguns amigos. Entre elas estava o gado da Dona Josina Rosa de Morais, sua irmã e mãe do nosso relator, que tinha a obrigação de manter o gado de sua mãe reunido, ali perto da aguada, para beber no dia seguinte, até que as chuvas voltassem.

Fora daí, aguadas só no Rio dos Bois, que  chegou a ficar em poças, correndo aqui e  acolá, segundo testemunho dos moradores mais antigos, entre eles os senhores Jovino e Josino Rosa de Morais, tios do relator, que possuíam terras nas proximidades do rio.  Segundo afirmavam, a seca de 1924-5 foi tão forte que provocou rachaduras na terra brejada  das margens e várzeas do rio, onde surgiram perigosos atoleiros, que mais pareciam um cemitério de  suas  criações enfraquecidas. Os córregos do Lajeado e do Castelo sempre foram muito vulneráveis a estiagens prolongadas. Há relatos de que o rio São Francisco já passou por situações  muito críticas.

 Em 1963, houve outra forte estiagem. A situação se agravou pelo estágio de desenvolvimento da agricultura do município. Haviam pequenas lavouras de arroz, feijão, milho, que aos poucos eram dizimadas. As famílias dos produtores desesperadas erguiam cruzes com troncos de madeira lavrada, os cruzeiros, nas nascentes dos córregos para onde  se deslocavam, carregando água e rosários em novenas e terços, pedindo a Deus a chuva para salvar gado e plantações.

Em 1924-5,  a precipitação anual da cidade de São Paulo,  a terra da garoa, atingiu meros 900 mm de chuva. Em situação normal varia de 1500-2000 mm. EGoiás a oscilação fica entre 1200-1800 mm. Há relatos documentados de seca completa do Rio Pardo, nas proximidades  de Ribeirão Preto e de outros rios no interior de São Paulo.

  Conforme jornais da época,  a  Light - concessionária de energia em SP - enfrentou muitas dificuldades para não deixar a cidade às escuras. Segundo Afonso Schmidt, em seu livro - São Paulo de meus amores - naquele ano, as torneiras foram transformadas em cabides, ou mesmo enfeites das cozinhas. 

Para corroborar estes acontecimentos constatados  e coincidentes, sabe-se que o regime de chuvas da região do Sudoeste de Goiás, devido ao avanço das  frentes frias,  tem relação com o do Estado de  São Paulo: quando uma frente fria faz chover por lá, chove aqui também. Quando não chove por lá, é seca por aqui.

 Em 1924-5, como registrado pela história, houve a pior estiagem do século naquele Estado. Pelos relatos antigos e  logística das chuvas o fenômeno de São Paulo ocorreu por aqui também. Portanto, não duvidem mais, o Rio dos Bois, de fato,  já secou.

 Ângelo Rosa Ribeiro nasceu em Quirinópolis, foi professor da EV-UFG. deputado estadual(2x), secretário de agricultura de Goiás (2x) secretário de planejamento de Goiás, superintendente da Semarh GO, chefe de gabinete da PGE-GO e atual residente e produtor rural em Quirinópolis GO.

Onde consultar:

Relatos de Francisco Rosa Ribeiro, blog horadoangelo, 03/01/2015.
  
Afonso Schmidt - São Paulo e meus amores, Secas e Inundações, Editora Brasiliensis, São Paulo, 1992.
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Revista Brasileira de Engenharia, 1926

O Jornal do Rio de Janeiro - A maior seca de São Paulo, 18/02/1925.

2 comentários:

  1. Boa tarde! Meu nome é Genival, nasci na sete lagoas, em Quirinópolis, me formei em economia na USP e em direito na Unic em Sinop onde tenho residência, sempre que posso visito o meu berço natal; e alguns anos atrás em uma dessas visitas, tive o prazer de conversar com o senhor Davi, do hotel Columbia, e ele me disse que seu avô lhes contava que o rio são francisco secou quase na sua totalidade no ano de 1915 faltando água para saciar a sede dos animais.

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  2. Boa noite Genival.
    meus agradecimentos pelo prestígio que nos foi concedido pela leitura do artigo. Nesta época, 1924-5, não foi só o Rio dos Bois que sofreu, também o Roio São Francisco, o Córrego Grande e o Castelo que se reduziram a poças d'água, aqui e acolá. Portanto, não há como se falar que antigamente o regime de chuvas era muito diferente de hoje.

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