sábado, 9 de janeiro de 2016

A lei de responsabilidade fiscal e a improbidade administrativa (2)

Leia antes o texto 1. Veja o blog. 

Isto colocado, passa-se a examinar a aplicação da Lei de Improbidade Administrativa-LIA, no que diz respeito à infrações cometidas por agentes públicos a luz do disposto na lei Complementar n. 101, a LRF.

Dispõe o artigo 73 da Lei nº 9.504/1997, que as infrações a seus dispositivos serão punidos na forma do Código Penal, do Decreto-Lei 201/67, da lei 1079,  de 10 de abril de 1950 (crimes de responsabilidade) e na forma da Lei de Improbidade Administrativa.

Primeira observação a ser feita é que era desnecessária a menção. Se a lei impõe obrigações aos agentes públicos e se tais obrigações são descumpridas, independentemente de disposição específica, pode incidir o disposto na Lei de Improbidade Administrativa. Igualmente, se a conduta encontrar tipificação em leis penais, incide o ali disposto, sem necessidade de disposição expressa a respeito.

Veja-se que a lei de licitações não contém dispositivo semelhante ao acima mencionado e, não obstante, a lei de improbidade é normalmente manejada quando se constata infração a seus dispositivos.

A segunda observação que se faz é que a lei de responsabilidade fiscal não criou nova modalidade de improbidade administrativa. Assim, na aplicação desta lei com relação a infrações de outra, há necessidade de saber se a infração existe e, existindo, se estão presentes os demais requisitos que fazem de simples infração à lei ato de improbidade administrativa. Para tanto, há que se lembrar da doutrina da lei de improbidade administrativa. O legislador definiu como improbidade: 

1.– auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função ou emprego;


 2. – qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação de bens e,


 3.– qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lea.dade às instituições.


A esta definição correspondem as três modalidades de ato de improbidade administrativa, a saber, improbidade da qual decorra enriquecimento ilícito (artigo 9.), improbidade da qual decorra dano ao erário (artigo 10) e improbidade da qual decorra infringência aos princípios que regem a administração pública.

A doutrina vem deixando claro que não existe responsabilidade objetiva em matéria de improbidade administrativa. Há que se verificar, sempre, se está presente o elemento subjetivo necessário à caracterização do fato como improbidade. Assim, nas hipóteses previstas no artigo 10, pune-se a conduta a título de dolo ou culpa; nas previstas no artigo 9. e 11, há que se verificar a existência de dolo. É claro que tal verificação deve ocorrer caso a caso, considerando as circunstâncias concretas nas quais a infração ocorreu.

Deixando de lado a improbidade na modalidade enriquecimento ilícito, porque não encontrei na LRF nenhuma hipótese de enquadramento nesta categoria, restam as duas outras modalidades para análise – dano ao erário e infringência aos princípios. É sabido que a ilegalidade, por si só, não acarreta a incidência da lei de improbidade.

Para se ter a improbidade há necessidade de constatação da ilegalidade e da verificação das condições em que o agente se encontrava para saber se ele agiu com inequívoca incompetência (culpa, só admissível no caso do art. 10) , ou com menoscabo aos princípios que regem a administração pública. É neste campo que se situa a análise do elemento subjetivo que anima o agente e que faz sua conduta reprovável. Assim não fosse, a cada concessão de ordem em mandado de segurança teríamos hipótese de improbidade administrativa. O MP vem operando com tais noções, adotando o critério da reprovabilidade da conduta, aferida pelas condições de fato em que se encontrava o agente. Neste sentido tem-se que a improbidade constitui-se na prática da ilegalidade acrescida de inequívoca   incompetência (culpa - art. 10 ) ou da vontade de infringir o princípio que informa a norma legal violada. Ex., casas populares. Repita-se que a improbidade e ilegalidade não são conceitos equivalentes. A primeira exige a segunda mais a reprovabilidade da conduta.

Por outras palavras, pode-se dizer que improbidade administrativa é a infringência inescusável dos princípios que regem a administração pública, daí acarretando enriquecimento ilícito, dano ao erário ou violação de deveres do cargo.

Simples ilegalidades são consideradas irregularidades formais. O Conselho Superior, de forma reiterada, adota este posicionamento, ao homologar arquivamento de IC onde se constata que à ilegalidade não se somou qualquer infringência inescusável a princípio que rege a administração pública. Ex. – licitação com vício em edital – se do vício não restou comprometido o caráter competitivo do certame, não se vislumbrou qualquer tentativa de favorecimento, entende-se que houve apenas irregularidade formal. O princípio foi atendido na essência, embora não na forma.

A LRF aplica-se a União, Estados, Municípios e Distrito Federal, já que ela teve a pretensão de trazer o que seriam "normas gerais" de finanças. É competência da União legislar a respeito de direito financeiro (artigo 24, I), concorrentemente com Estados e Distrito Federal, sendo que nesta hipótese de legislação concorrente a competência da união limita-se a estabelecer normas gerais.

Embora aplicável a todos os entes políticos, inclusive aos municípios, a própria lei de responsabilidade fiscal previu tratamento diferenciado àqueles com população inferior a 50.000 habitantes (art. 63), dando a eles prazos especiais para cumprimento de obrigações. Além disto, previu que a União prestaria assistência técnica e financeira para modernização das respectivas administrações tributária, financeira, patrimonial e previdenciária, para fins de cumprimento da lei (art. 64).

Isto significa que a própria lei reconhece que a imensa maioria dos Municípios não têm condições, no momento, de cumprir à risca os mandamentos da LRF. É a consagração legal do sabido. 90% dos municípios brasileiros, segundo informações da grande imprensa, têm menos de 50.000 habitantes e a LRF é aplicável a eles, não obstante a concessão de prazos especiais que, contudo, embora especiais, certo dia vencerão. Há que se ter máximo cuidado em aplicar a LIA em situações como esta, sendo de rigor a verificação concreta da infração, autoria e elemento subjetivo que animou o agente.

Dito isto, passa-se a verificar a possível aplicação da Lei 8.429/92 nos casos de infração às disposições da Lei de Responsabilidade Fiscal. 

Leia o texto seguinte. Veja o blog.

(Exposição feita no Seminário "Lei de Responsabilidade Fiscal – Aspectos Civis e Criminais ", ocorrido em 26 de março de 2001,evento organizado e patrocinado pela Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo na sede do Ministério Público do Estado de São Paulo (Rua Riachuelo, 115 – 9º andar)

Autora: Evelise Pedroso Teixeira Prado (Procuradora de Justiça em São Paulo e membro Conselho Superior do Ministério Público)

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Autora: Evelise Pedroso Teixeira Prado
(Procuradora de Justiça e membro do Conselho Superior d

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