terça-feira, 29 de novembro de 2011

Uma escola ao modo antigo

Uma escola rural e do modo antigo



A escola rural onde concluí o primário ficava próxima da sede do sítio onde vivi minha infância, no município de Quirinópolis - GO.  Nela, entre os anos de  1958 e 1961, estudavam cerca de 70 alunos, que vinham de longas distâncias, a cavalo ou em bicicletas, diariamente, com sol ou com chuva. Alguns tinham que madrugar, para chegar a tempo. O administrador era meu pai, o dono do sítio, que tinha construído a casa do professor ou sede escolar, contratado os professores e cotizava as despesas com os pais dos alunos que a freqüentavam.

          A sala de aula era um espaço amplo, com duas fileiras de longos bancos de tábuas, para quatro alunos cada. Uns baixos, para assento dos estudantes e outros mais altos, para a colocação do material escolar, estudos, tarefas, numa disposição que se repetia alternadamente. Meninos de um lado, meninas de outro, em dois agrupamentos separados por um corredor central. Como em qualquer outra sala de aula, na frente dos alunos, havia a mesa do professor e o quadro negro.

A escola funcionava em tempo integral, com dois turnos. O primeiro iniciava-se as 8:00 horas da manhã e terminava as 11:00, com intervalo para o lanche ou recreio, às 9:30. O segundo turno iniciava-se as 13:00, intervalo as 14:30, indo até as 17:00. Entre os dois turnos, havia o intervalo do almoço. Cada aluno trazia de casa sua refeição e seus dois lanches diários. Fora desses intervalos, não era permitido sair da sala, exceção feita para atender as necessidades fisiológicas.   Durante as aulas, o controle do movimento de entrada e saída era feito com a utilização de uma pequena pedra, a chamada licença, que ficava sobre a mesa do professor. Só havia uma licença, portanto, só um estudante de cada vez recebia permissão para se retirar da sala. Sempre havia discussões e reclamações quando um aluno demorasse a retornar. Os recreios da manhã e da tarde constavam do momento do lanche e de atividades físicas, com brincadeiras escolhidas pelos alunos, como futebol, salto com vara, disputa de corridas, jogo com peteca, banho no córrego e outras atividades. Algumas vezes os alunos eram organizados em filas para marchar, sob o toque de um tarol, um tambor e o comando do professor.

Na sala de aula, para maior controle das turmas e eficiência de seu trabalho, o professor exigia que os alunos iniciantes ou mais atrasados nos estudos ficassem nas primeiras filas, bem próximo de sua mesa. Os mais adiantados ficavam do meio para o fundo da sala. Sobre a mesa do professor, além da pedra da licença, estava a palmatória, um instrumento disciplinador ou torturador, em madeira de lei, com vários furos em sua cabeça redonda e achatada e um longo cabo de manuseio, própria para castigar os maus alunos; também uma régua, como objeto de múltipla finalidade, usada em batidas sobre a mesa ou sobre as tábuas de assento dos alunos, para alertar os sonolentos, além de um apito, para situações em que um sinal sonoro forte se fizesse necessário.  Até parece absurdo, mas era real. Tudo isso tinha sua aplicação, de forma prática, com resultados satisfatórios.

 Os alunos de séries diferentes ficavam agrupados em áreas distintas, no mesmo ambiente. Ensinamentos e tarefas diferenciados criavam uma dinâmica interessante, que beneficiava o aluno perspicaz. A escola tinha único professor, quase sempre do tipo autoritário e disciplinador.

No momento reservado a prática do ditado, onde o professor lia pausadamente um trecho de um livro, para que cada aluno copiasse em seu caderno, o professor sugeria que se realizasse aposta entre os alunos, em número de bolos de palmatória.  Quem obtivesse a maior nota, após a correção do ditado, tinha o direito de aplicar os chamados bolos de palmatória em seu concorrente. Quando o aluno se recusava em aplicar o castigo em seu colega ou o fazia de forma muito branda, o professor considerava que estavam brincando e castigava severamente, tanto o ganhador quanto o perdedor da aposta.

  Os testes de avaliação do aprendizado escolar eram realizados semanalmente, com os alunos enfileirados, em círculo, por nível de aproveitamento escolar, para a tradicional hora do argumento ou da argüição oral. Nela, o professor lançava a pergunta, que normalmente saia da tabuada de matemática, das aulas de português e de conhecimentos gerais, para alunos tidos como de menor desempenho, no início da fila do conhecimento, para ser repassada ao seguinte, até que fosse respondida corretamente. Outras vezes se dirigia aos mais adiantados, com perguntas que exigiam maior conhecimento. Quem respondia certo recebia um muito bem, do professor. Aos que erravam, sobrava o bolo de palmatória, aplicado com força, na palma da mão, pelo colega que acertou a resposta ou pelo professor, que a tudo controlava.

Este era o modelo da maioria das escolas rurais da época. Embora o método fosse extremamente severo, tenho boas lembranças desta escola. Tinha medo e vergonha do castigo, por isso procurava estudar com seriedade para não fazer feio nas avaliações do professor, na hora do arguição.  Não eram raras as crises de choro de alunos devido às fortes cobranças dos mestres. Diante de tanta pressão alguns pareciam traumatizados e não aprendiam satisfatoriamente. Havia notícias de escolas em que os considerados maus alunos eram submetidos a humilhações, como ficar de castigo,  de joelhos, com objetos exóticos sobre a cabeça, mas este não era o caso de minha escola.  Com três anos de estudos neste tipo de instituição fui para a cidade, realizar exames de admissão, sendo, aos dez anos de idade, aprovado para a primeira série ginasial, hoje a quinta série do primeiro grau.

                                         

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